Publicado em 04/12/2014 08h35

Depois da seca, chuva traz alento e riscos para agrigultores mineiros

Agricultores da Grande BH respiram melhor e começam a contornar as perdas causadas pela forte estiagem deste ano. Mas água em excesso também é ruim para as hortas e para os preços
Por: Estado de Minas – BH

chuva

Depois da longa estiagem, que prejudicou a produção de hortaliças no estado, provocando perdas de até 50% nos campos e hortas que abastecem as feiras e sacolões de Minas Gerais, os produtores começam a se preocupar com a chuva. As águas chegam para aliviar os prejuízos com o sol escaldante, mas complicam o cultivo da maioria das 60 espécies produzidas no estado, principalmente de folhosas e também das lavouras de tomates, cenoura, beterraba, brócolis, couve e repolho, entre outros cultivos. Na entressafra, que começa agora e termina em março, os preços desses alimentos são tradicionalmente mais altos para o consumidor. O alívio que as chuvas trazem, no entanto, ainda não teve reflexo no varejo e o período da seca, que atrasou o plantio, ainda vai influenciar os preços, provavelmente, até janeiro. 

No atacado, quer dizer na venda do produtor ao distribuidor e às redes de sacolões, supermercados e restaurantes, os preços subiram 4,1%, em média, no mês passado, frente a outubro, quando as chuvas começaram, para o conjunto de 150 produtos hortigranjeiros ofertados no entreposto de Contagem da Centrais de Abastecimento de Minas Gerais (CeasaMinas). A batata-inglesa foi a campeã das altas, com variação de 91,5% no mês analisado, sendo comercializada a R$ 0,90 por quilo. A evolução do preço do limão, de 29,7%, também se destacou. O quilo do produto custava R$ 3,10 em novembro, no atacado. 

A pressão sobre o bolso do consumidor poderá aumentar, se outros itens, como as frutas, não forem suficientes para conter a carestia à mesa. As hortaliças encareceram 8,33%, em média, neste ano, e os legumes ficaram, também na média, 10,33% mais caros, ante uma inflação de 5,99% medida de janeiro até a terceira semana de novembro, com base no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) da Fundação Ipead, vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O indicador retrata as despesas das famílias com renda entre um e 40 salários mínimos em Belo Horizonte. 

No chamado cinturão verde da Região Metropolitana de Belo Horizonte, os produtores voltaram a armazenar água e a religar sistemas de irrigação, mas é preciso mais uma ou duas semanas para que a oferta seja recomposta, se não houver variações bruscas do tempo que possam sacrificar o desenvolvimento das plantas ou comprometer sua qualidade. Há 20 anos no ramo, o produtor Robson Ney Lobato retomou o plantio em áreas onde a lavoura foi arrasada pela estiagem na Fazenda Vera Cruz, de Sarzedo. Cerca de metade da oferta diária de 13 mil a 13,5 mil unidades de 28 tipos de folhas teve de ser buscada junto a outros fornecedores, para que ele não interrompesse os contratos com grandes redes supermercadistas da Grande BH, sacolões e restaurantes. 

Instabilidade ruim 

“Foi o pior período de falta d’água que já enfrentamos, mas também prejudica a oscilação do clima, com pancadas fortes de chuvas, que retiram até o mato da terra”, afirma. Com o plantio atrasado, Robson Lobato buscou alface na zona rural de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (PR), distante cerca de 1 mil quilômetros, e no Rio de Janeiro, a um percurso de 500km das lavouras próprias. Em período de quebra da produção, a frota de caminhões da empresa dele costumava recorrer à plantações em São Paulo. A compra no Paraná encarece o produto ao redor de 35%, de acordo com o produtor. 

O vizinho Vicente Luiz Neto, dono do Sítio Rocinha, capaz de oferecer 800 unidades, por dia, em média, de alface, agrião, rúcula e coentro, enfrentou a mesma dificuldade para manter a produção no sistema de hidroponia. Das 120 estufas instaladas no terreno de 8 mil metros quadrados, 60 foram paralisadas por dois meses, baixando a oferta a 60 unidades diárias. Nos últimos 30 dias, as entregas retornaram ao volume de 500 unidades mensais, à custa da construção de um terceiro poço artesiano. “Nunca vi tanta escassez de água em 20 anos de trabalho no campo”, afirma o produtor, aos 80 anos. 

Em Brumadinho, no assentamento das Pastorinhas, a meta era colher, neste ano, cerca de 15 toneladas de hortaliças, que são vendidas nas feiras livres de Belo Horizonte e também direto ao consumidor. “Devemos produzir só 6 toneladas. Como a seca foi forte demais, a produção caiu muito”, explica Valéria Antônia Carneiro, representante do assentamento. Segundo ela, com a chuva, a produção do assentamento vai melhorar, agora concentrada em culturas como quiabo, milho e beringela. “Neste ano, que foi atípico, em plena safra o consumidor percebeu na feira livre a oferta menor de alguns produtos e preços um pouco mais altos”, avalia. 

Trocas nos cardápios 

Às vésperas das festas de fim de ano, a pesquisa de preços e a alternativa de substituição de produtos mais caros ganham força para o consumidor driblar novas altas de preços das hortaliças, legumes e frutas, observam Ricardo Martins, coordenador da Seção de Informações de Mercado da CeasaMinas, e Eduardo Antunes, gerente de pesquisa da Fundação Ipead/UFMG. Ricardo lembra que tendem a ficar mais altos os preços de produtos como batata, limão, cenoura-amarela ou baroa, conhecida como mandioquinha, abacate, goiaba, mamão e maracujá. 

Em contrapartida, podem favorecer o orçamento, contendo disparada de preços, quiabo, milho verde, alho, mandioca, ameixa, pêssego, nectarina e figo. Quem pode, opta por comprar direto do produtor, a exemplo do representante comercial Ernane Fernandes Alves, que trabalha frequentemente na Grande BH. “Compro de produtores pelo menos uma vez por mês. A economia é superior a 50% em comparação aos preços nos sacolões”, afirma. 

“Se as chuvas não forem equilibradas teremos uma alta perto de 10% no preço das folhosas”, calcula Pascoal Moreira, presidente da Associação de Produtores Rurais de Brumadinho. As chuvas que começam em outubro e terminam em março trazem mais doenças e pragas para as hortaliças, o que prejudica a oferta ao varejo, segundo Georgeton Silveira, coordenador estadual de olericultura da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG). Outra questão é que os produtos perecíveis como as folhosas devem ser fornecidos num raio de 50 quilômetros, limitando a oferta vinda de outros estados. “O produtor acaba reduzindo a área de cultivo de espécies de maior risco e investindo naquelas que sofrem menos, como o milho verde, quiabo, abóbora, pepinos”, explica. 

Ladislau Jerônimo de Melo, presidente da Associação de Produtores da CeasaMinas, diz que a chuva interfere muito na qualidade das folhas, frutas e legumes. “Quando temos água é bem mais fácil produzir no tempo seco.” Ele diz que neste momento é comum o consumidor sentir alguma alta de preços no sacolão, motivada pelo aquecimento do consumo em dezembro, mas também pelo volume de chuvas. Para os produtores, é como uma encruzilhada. Ao mesmo tempo em que torcem para que a chuva venha para recuperar as bacias dos rios, a quantidade além da medida ameaça a produção. 

Em Sete Lagoas, na Região Central de Minas, Benedito Rafael da Costa, representante da Associação de Hortas Comunitárias, afirma que o sufoco para driblar a seca foi grande. “A chuva resolve o problema da seca, mas com o excesso de água, muitas hortaliças não se desenvolvem.” Quando o volume de chuvas é alto a produção de alface, couve, cebolinha e vagem chega a cair 70% na região, nas estimativas do produtor. (MC e MV)

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