Na última semana, a Embrapa Pantanal participou de um encontro com instituições da sociedade civil, a convite de diversas organizações não governamentais (ONGs), para esclarecer o conteúdo da nota técnica publicada em agosto deste ano. Essa nota deverá subsidiar a legislação da Área de Uso Restrito (AUR) no Pantanal – que é a forma como o artigo 10 do Código Florestal define a região pantaneira – e deve servir como base para o Cadastro Ambiental Rural (CAR) no MS. Ela foi elaborada a partir de maio de 2013, a pedido do Instituto de Meio Ambiente do Mato Grosso do Sul – IMASUL, e inclui uma proposta de critérios para a substituição de vegetação nativas por pastagens cultivadas.
Durante o evento, que foi promovido pelas ONGs SOS Pantanal, União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN - Brasil) e WWF - Brasil, o pesquisador Walfrido Tomás falou com representantes de cerca de 20 instituições sobre os princípios adotados para elaborar a nota técnica. “Eles foram bastante receptivos e entenderam a necessidade de aliar questões de viabilidade econômica das fazendas às premissas do artigo 10 do Código Florestal – que definem o Pantanal como uma área cujo uso deve ser ecologicamente sustentável”, afirma Walfrido.
Essas propostas já haviam sido amplamente discutidas com o setor agropecuário em oito reuniões que aconteceram entre agosto de 2013 e setembro de 2014, além de órgãos ambientais dos estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. “É interessante que qualquer proposta, mesmo que tenha bases científicas, seja levada para esclarecimento e discussão com diversos setores da sociedade”, completa o pesquisador.
Intercâmbio de informações
Para Alexine Keuroghlian, da Wildlife Conservation Society (WCS – Brasil), a nota técnica da Embrapa assegura a manutenção de vários aspectos necessários para a preservação do Pantanal. “Principalmente através da ideia de conservar os ambientes aquáticos, que são altamente importantes, e os ambientes mais raros, como salinas”, afirma. Lucila Egydio, diretora-executiva da SOS Pantanal, diz que o contato entre os diferentes pontos de vista e experiências ajuda na compreensão das particularidades do bioma. “Ele tem especificidades que a gente tem que contemplar e é a abordagem de cada instituição que está aqui que vai ajudar a gente a ter um olhar mais global para o Pantanal”.
Esse intercâmbio pode ter consequências ainda mais impactantes: Aldem Bourscheit, que é especialista em políticas públicas da WWF - Brasil, ressalta o impacto que o conteúdo da nota técnica pode ter em outros estados e regiões do país, agregando valores e experiências a situações semelhantes. “É importante que esse tipo de regulamentação que a gente tem para os dois estados pantaneiros possa espelhar, com parâmetros de sustentabilidade, a manutenção e uso de áreas úmidas e planícies de inundação no restante do Brasil”.
Economia e ecologia
Para Luiz Fernando Merico, coordenador nacional da IUCN - Brasil, a economia pode estimular a conservação do Pantanal. “A água, a capacidade produtiva dos solos, a biodiversidade, o clima... enfim, tudo aquilo que sustenta a economia deve fazer parte do próprio funcionamento econômico (...). À medida em que esse funcionamento da economia se torne uma ferramenta de preservação, nós vamos estar caminhando em direção àquilo que precisamos”. E para unir economia e preservação, Roberto Gonçalves – diretor de desenvolvimento do IMASUL – sugere, por exemplo, a comercialização de serviços ambientais na região.
“O Pantanal não vai gerar riqueza ou receita exclusivamente com a atividade pecuária. O bioma tem que ter uma diversificação de atividades adaptadas à sua realidade que possam contribuir com essa geração de riqueza”, diz Roberto. Como alternativa para essa sustentabilidade econômica, ele cita a criação de cotas de reserva ambiental, usadas para compensar a falta de Reservas Legais obrigatórias em outras propriedades e biomas. “Existem áreas de Mata Atlântica no Pantanal, de Cerrado. Os donos dessas áreas podem transformá-las em cotas e comercializar sua manutenção”, afirma.
O pesquisador Walfrido Tomás ressalta, ainda, aspectos que vão além da plantação de pastagens que podem aprimorar a produtividade da pecuária regional, como “melhorias genéticas no rebanho, melhores práticas de criação e administração, certificação dos produtos locais, políticas públicas e linhas de crédito diferenciado para o produtor”. Ele fala também das alternativas desenvolvidas pela Embrapa Pantanal para estimular a melhoria dos sistemas produtivos locais aliada à sustentabilidade – como a Fazenda Pantaneira Sustentável, um sistema de avaliação que analisa e estimula a implantação de estratégias em benefício da produção rural da região. “Esses anseios se enquadram perfeitamente dentro da visão da Embrapa quanto ao uso sustentável do Pantanal”, diz o pesquisador.
Próximos passos
Ainda segundo o diretor de desenvolvimento do IMASUL, este é o momento de discutir soluções que considerem os aspectos econômicos da produção rural pantaneira e atendam, ao mesmo tempo, às exigências do Código Florestal para a região. “Estamos em uma fase de análise e discussão com a própria Embrapa, ouvindo também contribuições e críticas de outros setores que tenham alguma relação com essa questão”. Para o pesquisador Walfrido, “a gente faz o nosso papel, como empresa pública, de estar aberto a qualquer setor da sociedade para apresentar a proposta da nota técnica”.
De acordo com Roberto Gonçalves, o próximo prazo para que a legislação de uso da Área de Uso Restrito (AUR) do Mato Grosso do Sul seja finalizada é fevereiro de 2015.