Estima-se que no Brasil a erosão seja responsável por perdas anuais de 500 milhões de toneladas de solo e de oito milhões de toneladas de adubo aplicado às lavouras. O que reduz a disponibilidade de água às plantas, eleva os riscos de estiagem e aumenta o custo dos alimentos. Uma das principais causas dessa ocorrência é a semeadura “morro acima, morro abaixo”, ainda praticada no plantio direto.
No entanto, é possível adotar outra forma de plantar, o que significa reduzir em mais de 50% as perdas de água e de solo por erosão, em comparação ao “morro acima, morro abaixo”. Trata-se da semeadura em contorno, que consiste em realizá-la transversalmente ao sentido do declive do terreno. As linhas semeadas e as fileiras de plantas assim posicionadas criam barreiras ao livre escoamento da enxurrada, podendo aumentar em mais de cinco vezes a infiltração de água no solo.
De acordo com a Embrapa Trigo, que há anos realiza trabalhos com o objetivo de resgatar a semeadura em contorno, a prática perdeu espaço em razão do aumento do tamanho das semeadoras e pela troca das hidráulicas pelas de arrasto, principalmente em pequenas propriedades rurais. Em materiais da instituição, o pesquisador Antônio Faganello explica que “semeadoras de grande porte apresentam dificuldades de manobra no final das linhas de semeadura onde a maior dimensão da lavoura se estende ao longo do declive”. Segundo ele, a facilidade no plantio, seguindo o maior comprimento da lavoura, independente do declive, torna a operação mais rápida, porém, nem sempre a mais eficiente.
Como forma de contribuir com equipamentos que sejam melhor adaptados à operação em contorno, a FertiSystem, de Passo Fundo/RS, está desenvolvendo uma linha de semeadora específica para a prática, construída para acompanhar o contorno. Evandro Martins, presidente da empresa, explica que o protótipo está em fase de testes, que duram quatro safras, e deve ser lançado em 2025. “É uma demanda dos produtores e estamos trabalhando nisso há dois anos, com resultados muito favoráveis, mas precisamos de mais duas safras para consolidar o conceito e o desempenho a campo”, pontua.
A ideia do produto em desenvolvimento é facilitar o processo, neste caso para o plantio de trigo e arroz, mas lembrando que a semeadura em contorno serve para quase todas as culturas. O executivo completa que com os equipamentos que existem hoje, ao plantar em curvas fechadas, acompanhando as curvas de nível, as linhas se aproximam, principalmente as semeadoras de trigo, e trabalham de forma forçada. Dessa forma, não conseguem fazer o plantio invisível, ou seja, deixam o arrasto lateralizado, sem que as linhas se tornem paralelas umas às outras, além de alterar a profundidade da semente, que fica mais funda ou mais rasa, conforme o lado que a semeadora vai, mais interno ou externo. Além disso, podem alterar a população de plantas e as gramas de fertilizantes por metro linear”, descreve.
O trabalho da FertiSystem na semeadura em contorno é acompanhado de várias práticas conservacionistas que a empresa realiza em área própria de experimentos, para validar as tecnologias desenvolvidas, e também em área comercial. São 105 hectares de lavouras em Passo Fundo, com soja, milho, trigo, triticale, aveia, onde é adotado o plantio direto sustentável. “Praticamos a semeadura em contorno, manejo integrado com rotação de culturas, vazio outonal com plantas de cobertura, fixação biológica, formação de raízes e microrganismos”, destaca Martins.
Outro método que faz um elo de ligação entre o plantio em contorno e o sistema de contenção de água e as barreiras físicas são os terraços, também praticados pela empresa. A técnica moderna é denominada de Terraço for Windows. Conforme a Embrapa Trigo, a água retida nos terraços infiltra no solo, irriga a lavoura e demora de três a cinco meses para chegar aos rios. A água que não infiltra no solo é água perdida que em poucas horas já estará nos rios e somente voltará à lavoura na próxima chuva.
O executivo da FertiSystem explica que um programa computacional faz o dimensionamento do terraço, calcula o espaçamento vertical e horizontal, que hoje pode ser quatro vezes maior do que antigamente, e utiliza premissas de precipitação e infiltração de água no solo. “Logicamente que com a presença dos terraços fazemos também o mapeamento hidrológico da área, para que todos os caminhos que a água toma, o sistema de semeadura seja perpendicular a ele para ir contendo. Então cada linha de semeadura se torna um mini terraço em função da sulcagem”, descreve.
Por todas essas práticas sustentáveis, a FertiSystem recebeu em 2017 o prêmio Agricultor Conservacionista do Solo e Produtor de Água, concedido pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, através da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Irrigação. “É um pensar diferente. Hoje está todo mundo ligado à agricultura digital, de precisão, moderna e não se cuida dessa parte do plantio em contorno. Mas é importante o produtor adotar a prática com todo o manejo conservacionista, os resultados serão visíveis. E, para nós, é algo impactante trabalhar com nosso maior patrimônio que é o solo”, finaliza Martins.