No final de 2014, a fabricante suíça de chocolate Barry Callebaut divulgou em seu relatório anual que temia que houvesse uma escassez aguda de cacau até 2020. O relatório teve repercussão mundial, com dezenas de publicações repercutindo o “fim do chocolate”. Mas o fato é que o produto não vai faltar e o preço de sua matéria-prima está até em queda neste ano.
As principais causas para a escassez de cacau seriam a demanda crescente nos países emergentes, causada pelo aumento de renda da população, as doenças da lavoura, a crise do Ebola e a seca na África Ocidental, onde se concentra grande parte da produção mundial. Novas tecnologias e o incentivo para plantio e outras regiões, como a Amazônia, no entanto, devem garantir o fornecimento apesar da demanda crescente.
“Essas notícias são pouco consistentes, muitas vezes são divulgadas em favor de interesses particulares no aumento do preço do cacau”, diz Adonias de Castro, diretor do Centro de Pesquisa do Cacau, na Bahia. Ele destaca que esse tipo de alarme não é novidade, já que em 2010 foram veiculadas informações similares ligadas ao setor.
Como acontece com qualquer produto no mercado, o aumento da demanda causa a elevação dos preços, estimulando os produtores a investirem no cultivo de cacau. “Esses ciclos de queda da oferta, aumento de preço, e nova alta de oferta sempre aconteceram e sempre irão acontecer nas culturas permanentes, não há razão para desespero”, esclarece o engenheiro agrônomo Eugênio Stefanelo, especialista da Conab no Paraná.
A alta dos preços também viabiliza e motiva o investimento em novas tecnologias para melhora da produtividade e combate às pragas. “O aumento de preço é o melhor adubo para recuperar a oferta. A pesquisa resolve os problemas que vão surgindo”, diz o especialista.
Contudo, é importante observar que entre o aumento da demanda e a resposta dos produtores há um determinado intervalo de tempo, que deverá justificar os estoques, já que o cacau é uma cultura permanente e a planta exige um tempo de crescimento antes de se tornar produtiva, diferente da soja ou do trigo, por exemplo.
Ao lado da economia, é importante a participação do governo para garantir infraestrutura e melhores condições aos produtores, muitos em regime de agricultura familiar, que se veem pressionados a reduzir sua margem de lucro e vivem em condições precárias.
“Cabe ao países estabelecer estratégias e identificar nichos de mercado que os produtores possam agregar valor, como vem acontecendo na Bahia e no Pará, onde os produtores também processam a amêndoa sob a forma de líquido e até de chocolate”, sugere Adonias de Castro.
Queda de 2% foi o desempenho da produção de chocolate no Brasil de janeiro a setembro do ano passado, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates (Abicab). Para este ano, a previsão da entidade é que as vendas se mantenham no mesmo nível registrado em 2014.
Análise
Alarmismo acompanha o mercado de commodities
O cacau foi o eleito da vez, mas as notícias alarmistas sobre o fim de recursos naturais são frequentes quando se fala em commodities como alimentos – algumas fontes dizem que faltará comida em 2050 – e petróleo. Até hoje, elas não se confirmaram.
Na década de 70, quando se descobriu que o petróleo era um recurso finito, seu preço triplicou e acreditava-se que acabaria em poucos anos. Previsões mais atuais dão um prazo de 70 anos para o esgotamento do ouro negro.
“Se olhar o planeta terra como tanque de combustível, ele está pela metade, o que sobrou é petróleo contaminado e de difícil extração, para extraí-lo precisamos de energia, que é gerada pelo próprio”, alerta o economista José Pio Martins, reitor da Universidade Positivo.
Com recursos renováveis a lógica muda. Os alimentos passam por ciclos de desequilíbrio entre oferta e procura, logo corrigidos pelas próprias leis da economia, já que a demanda crescente torna o cultivo interessante aos produtores, de olho na alta dos preços. “Tudo que depende do uso alternativo da terra precisa atrair os produtores. Para destinar o espaço a determinado alimento ao invés de outro, é preciso que seu cultivo seja economicamente interessante”, diz Pio Martins. Quanto aos problemas de clima e doenças, Eugênio Stefanelo, da Conab, mostra tranquilidade: “sempre houve safras frustradas seguidas de safras cheias. A ciência vai resolvendo os problemas, mas só a alta dos preços incentiva o investimento em pesquisa”.