Publicado em 06/05/2015 22h01

Algodão em consórcios agroecológicos traz benefícios econômicos e ambientais

Algodão, milho, feijão, gergelim, melancia, abóbora... Tudo na mesma área, sem nenhum tipo de agrotóxico ou adubo químico. O sistema de cultivo do algodão em consórcios agroecológicos está ajudando a mudar a realidade de cerca de 450 famílias da região Semiárida. A diversificação amplia a renda do produtor e reduz os riscos de doenças e pragas do algodão, o que traz ganhos ambientais e de saúde ao reduzir a aplicação de químicos na lavoura.
Por: Embrapa

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As vantagens foram comprovadas em experimentos da Embrapa Algodão (PB) que aperfeiçoou o sistema introduzindo gergelim e novas variedades de algodão.

Além dos ganhos econômicos e ambientais, o cultivo em consórcio estabeleceu uma nova forma de negociação da pluma. O algodão, que antes era vendido a preços mínimos para atravessadores, hoje é exportado para a Europa a preços superiores aos praticados no mercado e com garantia de compra. A negociação prévia com os compradores foi a alternativa encontrada para assegurar a produção. As culturas alimentares são para o consumo familiar e o excedente é comercializado em feiras orgânicas e mercadinhos da região. O sistema vem sendo adotado nos estados da Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e Pernambuco, onde oito associações de produtores já obtiveram o Selo do Sistema Brasileiro de Conformidade Orgânica em seus produtos de origem vegetal.

Para o pesquisador da Embrapa Algodão, entomologista Fábio Aquino de Albuquerque, o ganho em produtividade do algodão em consórcio em comparação com o sistema de monocultivo "não é tão significativo, mas é superior". A diferença maior para produtor é no preço que é pago pela pluma agroecológica, além dos ganhos extras com as outras culturas escolhidas para o cultivo em consórcio.
"Na renda do produtor, temos um impacto maior porque como ele diversifica com outras culturas e agrega valor à produção. O gergelim é uma das culturas mais importantes no consórcio porque ocupa no máximo 10% da área, mas tem uma produção muito boa (cerca de 180 kg para cada 1 kg de semente plantada), se consideramos o pouco espaço que ela ocupa no campo, e praticamente não é atacada por pragas", calcula o pesquisador. Hoje o quilo de gergelim é vendido a R$ 8,00.

Quanto mais diversificado, melhor
O sistema de cultivo em consórcio consiste no plantio de diversas culturas, distribuídas em faixas, num mesmo local. O pesquisador Fábio Aquino recomenda que para cada cinco faixas de algodão, sejam plantadas cinco faixas de outras culturas. "Quanto mais diversificado for o consórcio melhor para o controle de pragas, pois aumenta a biodiversidade fazendo com que as pragas do algodoeiro sejam controladas pelos seus inimigos naturais, mantendo o equilíbrio do ecossistema", orienta.

Segundo ele, não existem regras rígidas para o cultivo em consórcio. O produtor é livre para experimentar o que é mais adequado para sua realidade. "Só recomendamos que o algodão não ocupe mais de 50% da área para possibilitar a rotação de culturas no ano seguinte, sem precisar ocupar uma nova área. No local em que o produtor planta o algodão, na safra seguinte, deve plantar a outra cultura do consórcio e vice-versa para melhorar as propriedades do solo", enfatiza.

O cultivo em faixas funciona como uma barreira que evita a dispersão das principais pragas do algodoeiro, entre elas, o bicudo, a mosca-branca e o pulgão. "O bicudo, por exemplo, é um inseto que tem uma dispersão relativamente lenta, então se o algodão está cultivado entre faixas com outras culturas, primeiro ele vai se dispersar dentro dessa faixa, para depois se dispersar em outra faixa, diferente do que ocorre quando se tem o monocultivo. Se você tem um hectare cultivado apenas com algodão, o bicudo tem campo livre para dispersar e causar danos. No caso das faixas, primeiro ele se concentra numa faixa para depois passar para outras faixas", compara.

Conforme o entomologista, na estratégia de convivência com as pragas nos sistemas orgânicos ou agroecológicos, o agricultor ganha tempo com as faixas. "O bicudo pode até destruir uma faixa, mas enquanto ele está destruindo essa faixa, as outras estão se preservando e garantindo a produção", diz.

Venda antecipada garante produção
O agricultor Anselmo Coelho da Silva adotou o sistema há oito anos, na propriedade de 19 hectares, no Município da Prata, região do Cariri paraibano, e calcula que teve um aumento em torno de 50% na renda familiar. Mas, antes de lançar a semente ao solo, o agricultor já sabe para quem vai vender. "O contrato fica bom porque sem comprador garantido a gente ia vender aos atravessadores e ter muito prejuízo", conta seu Anselmo.

Além da renda extra ao final da colheita, os restos da cultura também são uma opção para alimentar os animais. "Antes a gente vendia tudo em rama (pluma junto com o caroço). Agora, o algodão é beneficiado na miniusina da associação. A gente vende só a pluma. O caroço fica para plantar no outro ano e para dar aos animais", lembra o agricultor. "Depois da colheita, os restos de plantas que ficam no campo também são uma ração muito boa para os bodes e ovelhas, até mesmo em tempo de seca", acrescenta.

Seu Anselmo é um dos 450 produtores distribuídos nos estados da Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e Pernambuco que cultivam o algodão em consórcios agroecológicos sob encomenda. A produção é negociada antecipadamente com empresas do chamado comércio justo de mercado orgânico, entre elas, a Organic Cotton Colours (Catalunha), Vert (França), Natural Cotton Color e Justa Trama (Brasil).

Santi Marlloquí, diretor da Organic Cotton Colours, empresa catalã que trabalha há 25 anos com algodões orgânico e colorido, diz que a ideia dos contratos antecipados é oferecer estabilidade para que agricultores cultivem os algodões coloridos e de fibra melhorada. "Temos previsão de chegar, no mínimo, a 40 toneladas de pluma, mas por causa das chuvas, a produção pode variar muito. Nunca sabemos ao certo quanto algodão em pluma vamos ter no final da safra", afirma.

Conforme Santi, o preço fechado em contrato com os agricultores do Semiárido é de R$ 6,50 por quilo de pluma de algodão branco, R$ 7,50 por quilo de algodão da variedade BRS Rubi (marrom avermelhada) e R$ 9,10 por quilo de pluma da variedade BRS Verde.

Atualmente, o quilo de pluma do algodão convencional está sendo comercializado a R$ 4,60.