A produção de farinha de mandioca é uma atividade tradicional entre produtores rurais dos municípios localizados na região do Juruá (AC) e fonte de emprego e renda para diversos povos, inclusive para as populações indígenas. Para melhorar o processo de fabricação desse produto, moradores da Terra Indígena Poyanawa, localizada no município de Mâncio Lima, participaram, no período de 7 a 11 de setembro, de oficina sobre Boas Práticas na produção.
A capacitação integra as atividades do projeto "Farinha de Cruzeiro do Sul: fortalecimento da agricultura familiar e indicação geográfica do Território da Cidadania do Vale do Juruá, Acre", desenvolvido pela Embrapa, desde 2012, em parceria com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Secretaria Estadual de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (Seaprof) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, por meio da Superintendência Federal de Agricultura do Acre.
A Terra Indígena Poyanawa, distante cerca de uma hora da cidade de Cruzeiro do Sul, é composta por duas aldeias, onde vivem 140 famílias. Deste total, 85 famílias investem na produção comercial de farinha de mandioca, com foco no mercado local e de outras regiões. "A prática de fazer farinha nós herdamos dos nossos antepassados, mas estamos buscando mais conhecimento para melhorar o nosso produto. Sentimos essa necessidade porque queremos melhorar a produção e a renda. Trabalhamos com um mercado cada vez mais exigente e queremos oferecer um produto de qualidade", explica o líder indígena Luiz Poyanawa.
A oficina possibilitou aos indígenas conhecimentos sobre como devem ser conduzidas as diversas etapas de processamento da farinha, para garantir qualidade ao produto. De acordo com a coordenadora da cadeia produtiva da mandioca na Seaprof, Palmira Oliveira, instrutora da capacitação, o objetivo é preparar essas pessoas para uma produção dentro dos padrões exigidos pela legislação e, com isso, torná-los aptos a ingressar no processo para requerer a Indicação Geográfica para a farinha de mandioca, com selo de procedência do produto, junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
A produção de farinha contempla toda a região do Juruá, mas somente estará apto a receber o selo aquele produtor que realmente estiver produzindo dentro de critérios de qualidade que possam garantir um produto com segurança alimentar no mercado. O projeto identificou, entre os povos indígenas, que os Poyanawa produzem uma farinha com características bem próximas da farinha elaborada por agricultores tradicionais da região. "Então, a princípio, eles poderão participar do processo para requerer o selo para a sua farinha e identificar como um produto indígena", diz Palmira Oliveira.
"Queremos trabalhar junto com outros produtores da região no processo de reivindicação do selo de Indicação Geográfica para a Farinha do Juruá. Unindo forças o processo pode se desenvolver mais rápido e todos poderão se beneficiar. Teremos o selo de IG de procedência da farinha de cruzeiro do Sul em um produto com a nossa marca e que reflita aspectos da nossa identidade indígena", afirma Luiz Poyanawa.
As orientações durante a capacitação incluiriam o passo a passo para fabricação, desde a etapa inicial de descasque da mandioca na casa de farinha, até os procedimentos de embalagem do produto. Lavagem, prensagem e secagem estão entre os principais princípios de boas práticas de fabricação. Outra etapa importante que se não for bem feita interfere na qualidade da farinha é o resfriamento do produto, realizado como etapa final do processo de produção e que impede a absorção de umidade, aspecto que favorece o aparecimento de bactérias contaminantes. "Não queremos ensinar os indígenas a fazer farinha porque isso eles já sabem, mas vamos tentar orientar o processo de produção, para que seja elaborado de maneira adequada, seguindo princípios de boas práticas", esclarece Palmira Oliveira.
Segundo a pesquisadora da Embrapa Joana Leite, coordenadora do projeto, com a capacitação é possível racionalizar tempo, trabalho e recursos, além da garantia de uma farinha de mandioca saudável para o consumidor. A adoção de princípios de Boas Práticas no processamento da farinha de mandioca é fundamental para garantir a qualidade necessária para esse produto que é vendido como um alimento pronto para ser consumido.
Tradição na produção de farinha
O povo Poyanawa tem como base da sua economia a agricultura, principalmente a cultura da mandioca. Essa população tem uma forte tradição na produção de farinha de mandioca e está plenamente inserida neste mercado. Em 2013 foram produzidas 450 toneladas do produto, comercializadas junto a cooperativas da região, e a previsão para 2014 é que se chegue a 550 toneladas. Joana Leite explica que a farinha fabricada por essa população não difere, em termos de qualidade, daquela produzida por outros produtores familiares do Juruá. "Realizamos diversas análises desse produto e constatamos que as condições finalísticas do produto estão adequadas ao padrão de qualidade exigido para comercialização e consumo", afirma.
Luiz Poyanawa destaca que um dos principais fatores de mobilização nas aldeias, na busca por capacitação, é a preocupação com a higiene na fabricação da farinha. "Precisamos estar atentos aos cuidados necessários porque estamos produzindo algo que vai ser consumido pelas pessoas. Além disso, somos os primeiros consumidores e um produto com o padrão de qualidade recomendado pode garantir a saúde também nas aldeias", conclui.
A farinha de mandioca é um produto fabricado artesanalmente, com um fazer diferenciado. Entre os indígenas, esse conhecimento herdado dos ancestrais vem passando de geração em geração nas aldeias. Mas, os produtores despertaram para a necessidade de melhorar tanto o processo de fabricação como a estrutura de produção. Nas aldeias Poyanawa existem 16 casas de farinha e, de acordo com Palmira Oliveira, algumas famílias já incorporaram mudanças para adequação dessas estruturas, além das inovações no processo de fabricação de farinha, e isto facilita o processo de capacitação.