Publicado em 07/10/2020 14h20

Municípios devem ser protagonistas na questão ambiental

Seminário on-line promovido pela AEASP com a participação do Ministro Ricardo Salles trouxe à tona um debate sobre a necessidade dos municípios assumirem o protagonismo do compromisso agroambiental e com a sustentabilidade
Por: Assessoria de Imprensa

O papel de protagonismo que deve ser assumido pelos municípios foi o destaque da segunda parte do seminário on-line “Excelência dos Municípios no Desenvolvimento Agroambiental”, promovido pela AEASP – Associação de Engenheiros Agrônomos do Estado de São Paulo, no dia 29 de setembro.

O Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, participou do terceiro painel “Desenvolvimento Agroambiental – Missão dos Municípios”, destacando que, apesar dos esforços feitos pelo Governo Federal, o empenho principal na causa ambiental deve ser da municipalidade. “Temos a constatação de que o grande problema ambiental brasileiro está nas cidades e parte deles sob responsabilidade dos municípios. O Ministério tem consciência da necessidade de apoiar a municipalidade com os acordos setoriais e de logística reversa para o setor farmacêutico, eletroeletrônicos, de pilhas, baterias automotivas, lâmpadas e pneus. Isso vem contribuindo para desafogar um pouco do que é trabalho de competência dos municípios”, ressaltou Salles. 

Segundo ele, os municípios podem levar como exemplo de sustentabilidade as iniciativas de agropecuária, que se tornam um grande paradoxo, visto que em um mesmo município os problemas do perímetro urbano são decorrentes da falta de saneamento, enquanto que o campo atua com excelência no quesito de produção agroambiental.

“Há o contraste das boas práticas do setor do agro, que mesmo na pandemia seguiu trabalhando e gerando produtividade de receitas para o Brasil, enquanto que as cidades se fecharam, muitas delas, infelizmente, em ambientes insalubres, sem saneamento, sem cuidado com o lixo, sem a destinação correta de resíduos sólidos, deixando ainda mais evidente este paradoxo entre as boas práticas do agro e do caos ambiental dos centros urbanos”, ressaltou.

Para o ministro, antes de efetivamente partir para a adoção de iniciativas de reciclagem, muitos municípios ainda esbarram na falta de aterros, sendo que 50% de cidades de todo país ainda possuem lixões, além da ausência da coleta regular de lixo e saneamento. “Visando preencher essa lacuna, uma das iniciativas foi o investimento no programa para a extinção dos lixões, em que mais de 300 municípios foram contemplados e receberam equipamentos. Outro exemplo é Rondônia, que recebeu mais de R$ 60 milhões para zerar os lixões do estado”, apontou.

Estar atento ao meio ambiente é cuidar do plano estratégico dos municípios, pois é item fundamental para fomentar o turismo e a geração de renda. Este foi um dos pontos levantados pelo deputado federal Arnaldo Jardim em sua participação no painel. Com o tema “Reciclagem: benefícios para os municípios”, Jardim enfatizou que um dos grandes desafios ainda está na implantação da coleta seletiva, bem como a separação por parte dos municípios de resíduos e rejeitos.

“A reciclagem do papel significa uma redução de uso de energia entre 23 e 70%. Para cada 10% de caco de vidro que se usa na composição de novo vidro há 9,5% de redução no consumo de água. Na reciclagem do alumínio, a redução de emissão de CO2 chega a 70%. Então, cuidar da questão ambiental compensa e vale à pena. É cuidar do plano estratégico das cidades, pois atrai o turismo e gera renda. É preciso mudar o olhar na questão do lixo e a AEASP traz um evento oportuno às vésperas das eleições municipais, pois o tema é importante para o futuro das cidades. Ninguém ama mais a natureza que o engenheiro agrônomo e o produtor rural, que sabem bem que os fatores de produção dependem de uma biodiversidade preservada, fundamental para mantermos a alta produtividade”, disse. “Os municípios precisam ter um compromisso agroambiental com a sustentabilidade”, completou.

Também participou do painel o secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Marcos Penido. Para ele, precisa haver uma sinergia entre municípios, governos estadual e federal para que os objetivos comuns na preservação do meio ambiente cresçam e se tornem a grande ferramenta do desenvolvimento das cidades. “Os números de brasileiros que ainda não têm acesso a saneamento básico e água tratada são assustadores. Precisamos combater isso de uma maneira inteligente e estruturada. Só conseguiremos se trabalharmos unidos com os municípios trazendo alternativas. Neste quesito, a implantação de consórcios é fundamental”, ressaltou.

Penido exemplificou as iniciativas bem sucedidas do governo paulista como o Programa Município VerdeAzul – PMVA, que tem o propósito de medir e apoiar a eficiência da gestão ambiental com a descentralização e valorização da agenda ambiental nos município, e o Programa Agro Legal, recém-lançado, que auxilia na regularização ambiental no estado de São Paulo.

Municípios mais sustentáveis com atuação de cooperativas têm melhores índices no IDH

As cidades integrantes do Programa Município VerdeAzul e que possuem forte atuação de cooperativas são as que apresentam melhores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH). Esta foi uma das informações dadas pelos palestrantes do quarto painel do dia, o coordenador do Programa Município VerdeAzul, José Walter Figueiredo e o presidente da Ocesp (Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo), Edivaldo Del Grande.

De acordo com Figueiredo, o programa é um indutor de políticas públicas com propostas de melhorar a qualidade de vida dos munícipes com base estruturada principalmente na educação ambiental. “Todo trabalho é feito com forte atuação no desenvolvimento sustentável para que as cidades olhem para as questões da água, poluição do ar, solo e arborização urbana. Além disso, os municípios podem obter e adotar o selo VerdeAzul, que chancela que aquela cidade está no caminho do desenvolvimento sustentável. Este selo pode aparecer, por exemplo, em produtos industrializados e trabalhá-lo na questão econômica-ambiental”, explanou.

A presença das cooperativas nos municípios também auxilia para o desenvolvimento sustentável. “Uma pesquisa feita pela FEA/USP, de Ribeirão Preto (SP), apontou que as cidades com cooperativas atuantes apresentam índice de desenvolvimento humano superior às demais (0,70 em média contra 0,66). Das 645 cidades no estado, 580 têm cooperativas, o que demonstra a capilaridade do segmento, que traz muitos benefícios aos municípios”, apontou o presidente da Ocesp, Edivaldo Del Grande.

Entretanto, um dos segmentos que mais precisa de atenção é o de cooperativas de reciclagem. “A nossa grande preocupação é a sustentabilidade dessas pessoas. Temos trabalhado junto ao poder público para obter apoio das prefeituras. Vemos que este segmento já avança num bom grau de profissionalização nas grandes cidades, mas que ainda temos grandes desafios como o de agregar valor ao material”, comentou. 

Tecnologia digital é aliada na gestão da arborização urbana

Cuidar das árvores em um município não é tarefa fácil, pois, além dos manejos agronômicos, o gestor precisa estar atento aos aspectos jurídicos. As árvores disputam espaço aéreo com as companhias de energia e espaço subterrâneo com as de gás. Por isso, o tema arborização urbana traz uma complexidade e um desafio cada vez maior aos municípios.

O pesquisador da Esalq/USP, Marcelo Leão Machado, desenvolveu uma plataforma voltada à gestão de árvores urbanas. Durante o seminário on-line, ele mostrou o trabalho que está sendo feito em algumas cidades, como Piracicaba (SP), com a adoção dessa tecnologia.

“A tecnologia é composta por diferentes aplicativos móveis, dentre os quais para avaliação de árvore, solicitação para inspeção de risco e também para gestão com a possibilidade de se fazer um inventário das árvores. Isso garante um manejo adequado, uma orientação correta aos operadores de poda, além de fornecer indicações técnicas do manejo. Já para o munícipe, outro aplicativo faz a ponte para a abertura de um chamado junto à prefeitura”, explicou.

Segundo o pesquisador, o abandono da vegetação urbana traz prejuízos e, sem o controle das cidades, muitas árvores estão condenadas com risco de queda e causam inúmeros acidentes todos os anos. Somente no último verão, em São Paulo, caíram 7 mil árvores.

Para a diretora da AEASP, Tais Tostes Graziano, a qualidade da arborização nas cidades não deve estar focada somente na quantidade do número de indivíduos, mas também pelo plantio criterioso e a capacidade da gestão pública de manter esses indivíduos sadios. “O sucesso está em planejamento e gestão, conhecimento técnico e legislação que atendam normas legais. Pois, se não houver regras, não tem como fiscalizar”, pontuou.

Coleta e destinação correta de resíduos sólidos ainda é problema para metade dos municípios brasileiros

Metade dos municípios brasileiros ainda faz o descarte de resíduos sólidos em lixões. O último painel do seminário on-line tratou do estado atual, desafios, tendências, viabilidade de implantação e benefícios que o gerenciamento adequado dos resíduos sólidos traz.

“Infelizmente, muitos municípios fazem a coleta seletiva muito bem, mas pecam na triagem dos materiais recicláveis e a destinação tem ficado a desejar. Ainda temos uma realidade de que metade do lixo das cidades brasileiras está indo para lixão. Para avançarmos precisamos de um plano de gestão integrado de resíduos sólidos. Uma ação municipal integrada”, alertou o professor da USP São Carlos, Valdir Schalch.

Para o professor da Universidade Brasil, Evandro Tagliaferro, os gestores públicos precisam implantar mecanismos de sustentabilidade para o gerenciamento adequado dos resíduos sólidos. “É preciso criar o senso da responsabilidade compartilhada. O município precisa estar preparado para arcar com os custos deste serviço; em contrapartida, os munícipes precisam mudar o estilo de vida e compreender a necessidade de se implantar formas de obtenção de receita para arcar os custos. Se as pessoas não sabem o quanto pagam num determinado serviço, não se preocupam com a sua redução de custo”, destacou Tagliaferro. “É preciso usar a educação ambiental, os trabalhos de conscientização e mostrar que há necessidade do tratamento de resíduos porque isso impacta em saúde pública. O gestor vai economizar se ele investir”, completou.

Também participou do painel o presidente do INPEV - Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias, João Rando, que apontou o desafio de operacionalizar, na prática, iniciativas sustentáveis. Entretanto, iniciativas como o Sistema Campo Limpo, que faz a logística reversa de embalagens de produtos agroquímicos e agrodefensivos, vem para comprovar que é viável e possível. “Temos muito orgulho de sermos referência em economia circular. Todas as nossas embalagens fazem parte de um modelo que gera emprego e reduz o uso de recursos naturais”, comentou.

Segundo o superintendente do CONSIMARES – Consórcio Intermunicipal de Manejo de Resíduos Sólidos, Mimo Ravagnani, a responsabilidade pela reciclagem e a sustentabilidade do meio ambiente não deve ser somente do poder público. “Uma pesquisa feita pelo Ibope em 2018 apontou que 98% dos entrevistados achavam que era importante a reciclagem do lixo para salvar o planeta. No entanto, 66% deles não sabiam o que é uma coleta seletiva. Nosso papel também é fazer a população entender sobre essa necessidade”, ressaltou.

“Se há o consumo do que é produzido no campo é porque têm pessoas nos centros urbanos que absorvem esses produtos. Quando será que teremos maturidade para perceber que campo e cidade têm uma relação direta e dependente? Todos temos que trabalhar por um bem maior e não achar que o problema da falta de saneamento, por exemplo, é só dos centros urbanos. É preciso entender que o problema do esgoto também é meu problema como produtor rural e que, o problema que o produtor rural tem para a regularização da sua propriedade também é um problema do cidadão da cidade. Assim, talvez possamos ter um mundo com menos polarização. Com isso, poderemos trabalhar muito mais direcionados a fazer o que é bom para o bem comum”, comentou a presidente da ABAG Ribeirão Preto, Mônika Bergamaschi, que atuou como moderadora dos três últimos painéis do evento.

“Eu sonho um dia, quando acabaremos com esse ‘nós e eles’, campo versus cidade. Não importa a ideologia. Todos nós, urbanos ou rurais, vivemos dentro de municípios e as políticas públicas devem ser para o todo, para as cidades no geral. O problema agroambiental é da sociedade como um todo”, completou.

Em sua participação no encerramento do evento, o presidente da AEASP, João Lammel, apontou que o objetivo principal do seminário on-line foi atingido: o de compartilhar iniciativas e projetos bem sucedidos para que possam ser inspiração para outras localidades. “Acredito que a mensagem principal foi passada e muitos assuntos de interesse comum foram compartilhados. Tivemos exemplos de várias iniciativas que poderão ser replicadas em outros municípios”, comemorou.

O evento “Excelência dos Municípios no Desenvolvimento Agroambiental” foi realizado pela Associação de Engenheiros Agrônomos do Estado de São Paulo (AEASP), com o apoio do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo – CREA-SP e colaboração da CONFAEAB – Confederação dos Engenheiros Agrônomos do Brasil, da Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos de São José do Rio Preto e da Universidade Brasil. 

A íntegra do evento pode ser assistida no canal da AEASP no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=mGCov-7_3nk